sábado, 15 de maio de 2010

DOMINGO PEDE PALAVRA - 8

DOMINGO PEDE PALAVRA




  


A INFINITA CHAVE DO TESOURO INSONDÁVEL

 
 
Somos o encontro e o resultado de três realidades da vida a nos compor. A física, a química e a biológica. O encontro das três “ciências” forma a vida. E a partir dela ergueu-se um império. O império de vários nomes. Pode ser chamado de cultural ou de espiritual, por exemplo. Espírito é uma palavra de amplo espectro semântico. E pode significar coisas diferentes de acordo com o universo no qual se movimenta. E é uma palavra linda do acervo humano.

A física a nos movimentar. Somos seres físicos. Nadamos, caminhamos, corremos, pulamos, dançamos. Movimentamos nossos braços ao imperceptível sinal emitido pela central física de nosso cérebro.

A química porque somos uma usina de transformação ambulante. O pastel que comemos, o alimento, o açúcar que ingerimos, o caldo verde da cana, a frutinha roxa, a carne rósea do peixe, a energia que se transforma em nós, as transformações ocorridas em nosso organismo com os alimentos e a vida que se processa em nosso interior. Somos mais do que uma máquina: somos uma fábrica onde só entram os produtos permitidos para a produção da coisa. Se comermos sabão ou ingerirmos detergente, poderemos morrer. Participamos como seres químicos da combustão universal.

Somos biológicos porque não nos diferenciamos de qualquer ser do planeta. A flor que se reproduz pela polinização, a semente que renasce distante, a corça que corre na floresta, o pássaro que sobrevoa acima do lago, onde abaixo da superfície formas de vida se reproduzem. Participamos do complexo e maravilhoso mundo da vida biológica.Somos parte do espetáculo.

Mas há algo que nos diferencia dos outros seres. Algo que através dos tempos evolui, algo que na profusão delicadamente harmoniosa dos nossos neurônios brota. No reino absoluto dos feixes elétricos da nervura dos entrelaçamentos de milhões e milhões de feixes de luz e sensitivos surgem as emoções, os sentimentos, as vontades, os sonhos, os ideais...

E é ali, no gigantesco e medonho centro de neurônios formados pela junção das três “almas” do ser (a biológica, a química e a física) a reproduzir a sincronia e a harmonia do percurso universal que a maravilha de ser humano se manifesta.

Há, em nós, todos os elementos do universo. Todos os metais, todos os minerais, por isso, inclusive, é sábio acreditar que na própria natureza estão as soluções, as curas e as respostas para todos os males.

Entretanto, o que nos diferencia é o infinito edifício da cultura (o império) que em nossa mente foi erguido e que é transmitido de geração para geração. O choro, o medo, a consciência da morte, a alegria, as sensações diante de uma pintura, o gosto por determinado alimento, as repressões (invenções humanas), enfim, a cultura que foi erguida dentro do ser único.

As religiões que foram criadas, as tentativas místicas e esotéricas de se explicar o inexplicável, ou seja, aquilo que ainda não é compreendido em determinada época. Os tesouros da mente, acumulado e lapidado nas camadas do tempo da evolução das coisas que passam. Tudo a compor e a resumir o que os antigos primordiais do pensamento denominaram alma.

E assim o legado da antiguidade preservado através dos séculos, desde Hesíodo, os pré-socráticos, os orientais, o platonismo, a patrística, os povos do continente que os novos habitantes chamaram de América, tudo e todos. Eis é infinita chave da sobrevivência.

É ela que abre as portas do futuro, e o futuro é uma quimera que vai sendo devastada, o futuro transforma-se em presente pela vontade da vida que pulsa. Mas é fortalecido pelo passado, o seu nutriente, o eterno alicerce. Somente pisando no que era medo o homem abre o futuro, somente pisoteando as incertezas rasga a cortina do futuro. Somente aceitando o chamado e deixando-se seduzir pela grande mãe curiosidade, ele torna-se o grande construtor, e em cada época, o épico de si mesmo.

Por isso a criança é preparada em sua própria constituição, em sua própria “natureza mental”, e assim é a “alma infantil”, excessivamente curiosa. A criança naturalmente curiosa ao extremo desvenda a sobrevivência da humanidade. Essa é a grande generosidade infantil: e extrema curiosidade por tudo. A criança tem todo o tempo do mundo, mas tem pressa em desvendar os segredos da vida. A sua infância reproduz a infância da humanidade, por isso o homem tornou-se educador de si mesmo.

Ao transmitir para a criança o patrimônio mítico, as cantigas, as histórias criadas pelo espírito humano, ele participa da eterna reconstrução da preservação humana.

A infinita chave é a transmissão do legado, é a vontade de romper com todas as cortinas, todos os véus, é a preservação dos saberes acumulados, é a transmissão do que há de mais generoso na “alma” mental, o que foi construído sobre camadas palimpsestas – pois que é o homem senão palimpsesto de si mesmo?-, sobre atritos, conflitos, guerras, incompreensões seculares, medos memoriais, temores ancestrais; o que se diz agora é que a generosidade que há na “alma humana” foi lapidada através dos tempos numa construção que necessita do exercício do pensar para ser compreendida.

O homem, construtor de si mesmo, é também o construtor do afeto. A expansão da sua “alma” edificou cidades porque compreendeu num dia distante que precisava morar, construiu foguetes porque um dia olhou para as estrelas com um novo olhar, e construiu poesia porque um dia construiu idiomas, e porque um dia compreendeu que pode conquistar o universo, mas o tesouro insondável está em seu íntimo, em seu interior, dentro dele mesmo.

É dentro dele que a chave infinita abre as portas do tesouro insondável.

É por isso que um poema sobrevive através dos séculos, é por isso que a palavra do filósofo jamais será totalmente desprezada, é por isso que o mítico e o místico jamais devem ser esquecidos, pois ambos se referem às fases da alma.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Viva a Poesia! - Tartaruga e Jacaré

Olá, pessoal!

Os versos que estou postando hoje são do meu livro: BICHINHOS DO ZOOLÓGICO, editado pelas Paulinas. Apesar da "cara feia", o jacaré é um dos animais mais visitados pelas crianças no zoológico de São Paulo. Ilustrações de Marchi.
Um abraço e um beijo,
Regina Sormani




Tartaruga é companheira
Desta vida preguiçosa...
Ela nunca sente medo
Desta boca perigosa.
Nós,jacarés,
Queremos descansar,
O sol, pra dormir.
A água pra boiar.

domingo, 9 de maio de 2010

Técnicas de Ilustração- 3- Monanelore


Caros,

Esta arte foi para mim uma experiência interessante. Nunca havia tentado trabalhar com lápis carvão e posteriormente, sem fixar, aplicar as cores com Supracolor. Para quem não conhece, Supracolor é uma marca de lápis aquarelável, mas, não usei água. Somente usei como lápis tradicional. Quanto ao carvão, utilizei esfuminho para fazer as passagens suaves e fusões. O suporte foi papel Fabriano Cotton. Fiz o trabalho para a Agência Z+ e o cliente foi a Associação do Gado Nelore.
Também pode ser vista na Revista Abigraf nº 246, na página da SIB, dedicada à ilustração.

Abraço,

Gilberto Marchi

sexta-feira, 7 de maio de 2010

DOMINGO PEDE PALAVRA - 7 - MÃE DE TODOS OS LUGARES

MÃE DE TODOS OS LUGARES
 
 

Os shoppings e a propaganda se irmanaram na apresentação das mães em anúncios. Jovens, atraentes e modernas, muitas querendo ganhar de presente um celular ou algum aparelho eletrônico ou tecnológico.

Claro que há mães jovens e modernas. Aliás, hoje o modelo tradicional de mãe distante dos filhos tende a desaparecer. Ela vai com a filha ao Shopping usando a mesma roupa e falando praticamente a mesma linguagem.
E claro também que qualquer mãe fica feliz ao ganhar um presente. Qualquer pessoa fica.

Mas preciso falar de uma outra mãe, a que está em todos os lugares, a mãe dos filhos deste solo, a construir a sua história com sangue, suor, luta e garra.

A mãe que está nas ocupações de terra, nas vilas que são erguidas, no enfrentamento, na audácia, na coragem e na força. Mãe equilibrando-se nos supermercados para conseguir garantir a sobrevivência, também sentindo orgulho de ser brasileira, sem arredar pé da bravura e da ética.

Mulheres que estão ao redor de cada um de nós, nas periferias feridas, engolindo fumaça, na beira dos barrancos, buscando papelão, juntando latinhas, juntando moedas para comprar o pão de cada dia.

Mulheres que desaprenderam de sonhar com um sapatinho novo para o pequeno, que não estarão jamais no grande outdoor dos templos de consumo.

Mães nas fazendas e nos campos, às vezes perdendo a filha, às vezes perdendo seus homens. Com seus gritos silenciosos e abandonados.

Onde estão os responsáveis pelas mães que não ganharão presentes materiais? O que seria um problema menor, se nem um abraço poderão ganhar, às vezes porque o filho se foi, se perdeu no labirinto medonho das ruas.

A horrível aparência da indiferença costuma se fazer de invisível, e muitos, quando entram numa grande loja de departamento com o seu cartão de crédito – a grande ilusão-, para presentear (sempre merecidamente) a sua mãe, certamente esquecem das mulheres que vagam em tanques e na poeira das ruas pobres do país.

O ideal parece às vezes uma quimera. Ninguém ousa sair por aí abraçando mães desconhecidas, como se existisse isso. A mãe é universal, esteja ela com o rosto traçado por fibras e linhas de uma jornada heróica de lutas e sofrimentos, seja ela elegante e luxuosa.

A mãe favelada que oferecia o seu seio quase sem leite para a criança faminta e olhava através das frestas do zinco para a vastidão das estrelas e ocultava em soluços o pranto amargo das saídas aparentemente cerradas, talvez caminhe por uma rua qualquer da zona leste com saudades do filho que a vida embruteceu.


Todas as mães, em todos os lugares, inclusive no centro de guerras idiotas que levam vidas promissoras. E choram o pranto mais comovente do planeta, o da mulher que perde o fruto do seu ventre.

Todas as mães, em todos os lugares: um feliz dia das mães, da forma como tal coisa pode ser para cada um. E seja quem for o filho, lembre-se, beijo sincero e abraço profundo não precisa de fila de crediário nem de saldo no cartão.




MARCIANO VASQUES
DOMINGO PEDE PALAVRA

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Um livro belo e interessante.






Meus queridos,
Estive ontem à noite, 05 de maio, no lançamento do livro: CONTOS FOLCLÓRICOS BRASILEIROS de autoria do meu amigo Marco Haurélio, ilustrado pelo Maurício Negro, Paulus editora. O lançamento aconteceu no espaço da Livraria Cortez, em Perdizes.
No livro do Marco, vamos lendo e nos envolvendo com: Contos de animais, Contos de encantamento, Contos religiosos, Contos novelescos, Contos jocosos, Contos acumulativos e Contos de exemplo. Li, gostei e recomendo a todos.
Parabéns, caro amigo! Muito sucesso!
Um beijo carinhoso,
Regina Sormani

Nomes indicados para a homenagem 2010

Alò, pessoal!

Durante a primeira reunião da AEI-LIJ regional São Paulo, do dia 28 de abril, na Assembleia Legislativa, surgiram alguns nomes, dentre os quais vai ser escolhido, no decorrer do ano, aquele que será homenageado em 2010.
Foram indicados: Pedro Bandeira, Ruth Rocha, Eva Furnari, Maurício de Souza, Ísis Valéria, Edmir Perrotti, Francisco Marins, entre outros.
Para definir o escolhido, ou escolhida, ainda faremos mais alguns encontros e postaremos o resultado aqui no blog.
A Ceciliany, da editora FTD, compareceu e conversou um bom tempo com nossos associados, falando a respeito do panorama da poesia nfantil no mercado editorial e da importância de produzir e oferecer livros interessantes ao público juvenil.

Forte abraço,
Regina Sormani

sábado, 1 de maio de 2010

DOMINGO PEDE PALAVRA - 6 - O CIRCO



DOMINGO PEDE PALAVRA





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O CIRCO

“Vejam só que história boba eu tenho pra contar/ quem é que vai querer
me acreditar/ eu sou palhaço sem querer”
SONHOS DE UM PALHAÇO
Antonio Marcos /Sérgio Sá




Nas noites em que eu colhia vaga-lumes para fazer os lampiões, também durante o dia no quintal brincava de armar circos. Eu e minha irmã costumávamos correr logo cedo com os lençóis para que o circo já estivesse erguido na manhã. Tudo era aproveitado. O caule descascado de um eucalipto pequeno que nosso pai guardava para algum cercado ou um galinheiro que planejava, e que era por nós colocado num buraco que fazíamos bem ao centro do quintal, o próprio varal, a cerca, as madeiras espalhadas e as cadeiras. O picadeiro corria por conta da nossa imaginação. A mãe no tanque ou na varanda fingia que não estava vendo e só dava a bronca bem mais tarde quando o espetáculo já havia terminado e então nos obrigava a desmontar tudo e a recolher os lençóis. Assim eram erguidas as nossas manhãs.
Um dia quando ia para a escola reparei que havia um circo triste no meio do caminho. No meio do caminho havia um circo entristecido mais ainda pelo meu olhar campeão de perplexidades e descobertas.
Minha mãe esbravejando contra o comerciante que havia vendido para ela o meu presente de aniversário com defeito, pois não se conformava com o fato do estojo com vinte e cinco soldadinhos de chumbo ter vindo com um defeituoso. Sim, um deles veio sem uma perna e minha mãe ficou muito brava. Eu nem me importava com nada do que ela ralhava naquela tarde friorenta, pois não tirava os olhos do circo triste que ficava para trás.
Um circo triste era algo impensável para o meu coraçãozinho. Era a mesma coisa que um palhaço chorando de verdade. Uma coisa que não podia existir.

Como menino faz a infância com perguntas eu me perguntava o porquê da tristeza daquela lona. Nunca compreendi aquela melancolia chuvosa. Nada tinha a ver com a chuva fina que afinal lavava o circo.
Enquanto tremia de frio no banco da escola comparava o circo triste com os livros fechados de uma biblioteca que eu tinha visitado. Se eu pudesse, teria aberto todos, pois gostava mesmo era de alegria!

Gizes e lápis e meu pensamento voando para o circo. Era época de balões no céu e era tão bom viver uma meninice assim de papel de seda no céu e circos pobres nas várzeas arenosas e nos terrenos alagados. Um dos que não esqueci ficava num terreno da rua da pequena fábrica de sabão. Lembro-me de tê-lo visto certa vez quando corria atrás de um balão.
Mas o tempo passou e embora o “era uma vez” nunca se vá de verdade, as coisas essenciais vão se dissipando e nossa alma ensaia ficar virtual, tecnológica e de concreto.
E Arrelia morreu.

Num outono frio de maio Arrelia partiu. As cortinas desceram e as luzes do picadeiro se apagaram.
Nunca vi a cena comovente de um palhaço se pintando, mas fiquei em filas inesquecíveis e entrei com o coração saltitando mais que gafanhoto a deslizar em verdes, num circo de chão de barro, e jamais sairá de mim aquele universo de pipoca, pirulitos em forma de guarda-chuvas e algodão doce, e o nariz vermelho de um palhaço que estava ali para alegrar o meu coração.
E hoje no alto do tempo e no arco da minha vida é que compreendo que eu sempre quis que a vida fosse uma eterna “arrelia”.






MARCIANO VASQUES


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