domingo, 26 de setembro de 2010

DOMINGO PEDE PALAVRA - 22

SHREK E SHREK

Li recentemente um artigo na revista "Pátio", de Educação Infantil. O texto, assinado por dois excelentes psicanalistas, recebeu o título: "Contos de Fadas para o Século XXI". Caboclo mais cismado que sou, já olhei meio desconfiado para o nome do artigo.
Quero me ater ao parágrafo que fala especificamente do Ogro. Claro que discordo, não é? Mas é bom saberem que sou apenas um escritor, autor de Literatura Infantil, e estudioso, senão não posso querer ser chamado de escritor. Tenho que mergulhar nas letras. Nada de enxurradas ou avalanches teóricas, apenas ler muito. Sinto um prazer imenso nisso.
Diz o texto: " O humor veio para ficar nas histórias infantis contemporâneas". Tá.
Vamos ao Shrek. O Ogro não é afinal tão ingenuamente bem intencionado, não é exatamente assim como dizem os autores do texto, e não tem no meu entender essa coisa das referências como algo exatamente positivo. Mas, vamos em frente:
Shrek é criação da Dreamworks, e surgiu com o objetivo de desbancar a Disney, que ergueu o seu império graças aos contos de fadas, e não apenas ao ratinho. Ora, é império contra império! Nada na origem do personagem tem realmente a intenção da criança, isto é, Shrek surgiu não preocupado com o público infantil, mas sim em abalar o outro império. A questão então fica assim: feito para adultos também encantou as crianças, claro. Entre lances divertidos e inteligentes, muita tolice (e adulto geralmente ri de tolices, a criança é mais peneirada, mais pura, mas é induzida pelo Mcs da vida e pelos adultos)...Vamos lá? Não sei realmente no que o personagem contribui para a criança. Qual é a vantagem? Qual é o lucro (Para usar a linguagem da Dreamworks) para os pequenos ao ver o boneco Pinóquio de roupa íntima feminina? Qual a vantagem para a criança ao ver um príncipe afeminado? Ora, mata-se ali dois coelhos, não é? Primeiro, desmoraliza-se o príncipe, que é uma referência na literatura infantil; o príncipe é por excelência virtuoso, ele é a própria virtude, não importa para a criança se na vida real príncipes podem ser cafajestes ou desonestos. O que importa é que o príncipe é virtuoso, ele é o modelo, ele é a utopia. O olhar contemporâneo precisa se aprimorar, inclusive o olhar banhado pelo mundo acadêmico. Príncipe é fundamental, é principalmente o grande, o melhor modelo a ser seguido, e também, claro, as princesas.

Sim, os valores e as referências são outros, não cabe mais o príncipe como modelo para as crianças, diriam. (Além daquela bobagem de que as princesas são loiras. Ora, são loiras porque são nórdicas, são da Europa, só por isso. Seriam negras se fossem africanas ou amarelas se asiáticas. Isso lembra o povo paulista reclamando que Brasil é escrito Brazil nos EUA, ora, é escrito assim por ser em Inglês, e também lembra muita gente boba reclamando que a Palavra Telefonica não tinha acento. Claro, o nome da empresa não é uma palavra brasileira).
Veja só: o menino zica que eu conheci na Favela Tiquatira e também as crianças com quem convivo em minha vida de educador, têm outras referências, outros valores, é, é assim mesmo, que príncipe nada!, é a realidade ali crua e nua, é o traficante, o policial violento. Então, o Shrek atira em todas as direções, pois "os contos de fadas já não combinam com o século XXI", e a sua coelhada é justamente o riso e o deboche com a questão do homossexual, melhor investir nisso e vamos a um príncipe efeminado e a criançada vai rir sem parar, sim, é isso que já mostram para ela, se alguém tiver dúvidas, ligue a TV, ou peça a palavra para qualquer um dos nossos ministros da cultura, podem começar pelo Sérgio Mallandro.
Bem, é bobagem escrever mais. Quem está perto geralmente não lê.
Todo artigo tem seu valor e o artigo da revista também, mas , é  claro, essa questão do Shrek precisa ser revista, com certeza, e urgente, assim quem sabe o cinema infantil entra na roda, não é? Já que deu a louca....
E antes que alguém comente entre si que esse escritor está maluco, pois contos de fadas são desatualizados e príncipes e princesas já eram, eu poderia dizer o seguinte. Quanto engano! Falando nisso, dedicarei o meu domingo à minha princesa.

( Só pra lembrar. Esse papo da supremacia do príncipe nos contos é uma bobagem. Pensem na força da princesa. Vejam que por um fio de cabelo Tristão rompe mares...Nem imaginam o que um príncipe é capaz de fazer por uma princesa! Se meti o chocalho em algum discurso acadêmico e posto como rocha, sinto muito)

Marciano Vasques

2 comentários:

VELOSO disse...

Muitobom o texto faz a gente refletir, parabens!

MARCIANO VASQUES disse...

Veloso, meu grande!
Fico contente que tenha lido e gostado. E por aqui o meu abraço e amizade,
Marciano Vasques