domingo, 10 de outubro de 2010

DOMINGO PEDE PALAVRA - 24

O ROMANCE DO BRASIL


Hoje é domingo, de Cachimbo, e o domingo é para pensar, mas pensamentos que remam a leveza ao sabor do vento. Vento saboroso que traz ondulações da memória.
Escrever é essa delícia sem preço, e vamos tocando em frente, que a memória é urgente.
O "Estadão" lançou uma coleção de discos. Incompleta, meu irmão. Cadê  o "Quero que vá tudo pro inferno"? São vinte e cinco volumes, ou CDs, essa coisa que não consegui assimilar. O CD sempre foi para mim algo como o Gibi indo para o formato pequeno. Nem continuar as coleções deu mais vontade. Temos que nos adaptar aos novos formatos?
Mas quem não nasceu para formatação tem dificuldades.
Velejando vamos que a poesia me espreita. Um passeio pela canção do Brasil é algo por demais nutritivo para essa alma faminta de cultura. É um romance.
É curiosa a voz do tempo: Numa época uma canção podia estampar o máximo de rebeldia possível, Meu carro é vermelho, não uso espelho pra me pentear. Assim íamos. Hoje o que mais tem é carro vermelho, e ninguém repara se eu me penteio ou não.
A canção sempre dirá sobre a época. "Na batucada da vida" e "Pelo telefone" são documentos históricos. Falam sobre ações da polícia ou de soldados. Poderíamos ver que certas coisas não mudam. Apenas se adequam.
E a canção prossegue o seu passeio de aventuras. O que era sopro virou ventania. Patativa do Assaré e quem sabe faz a hora.
O romance do Brasil está na canção, é na alma do cancioneiro que encontramos o pulsar de um coração tropical com raios matinais de sertões que não findam totalmente. Sonhar Contigo é sonhar ao teu lado. 
Saudades da Amélia? O seu cabelo não nega. "Você me adora, me acha foda". O romance da canção é fascinante, revela em si a alma do tempo. Pois é, pra que? 
De canção poderíamos ir para a poesia, sem correr o risco de ir aos poetas. Ou seja, em princípio não é necessário ir aos poetas. Poemas como os de Quintana e até os de Drummond são de fato como um doce de Cora Coralina.
O escritor é um ser que vive perigosamente. Pensa que é fácil ser escritor? Veja o que aconteceu: Jonathan Franzen teve os seus óculos roubados e um pedido de sequestro que daria realmente muito trabalho para a polícia. Isso aconteceu na feira de Frankfurt. Escritor onde quer que esteja corre risco de vida. Pode ser assediado pela multidão, um Caetano dos livros.
Veja no Brasil. Um sujeito que escreve, além de escrever é amplamente valorizado como um profissional da Palavra. Assim como o pedreiro que ergue casas, o escritor tem os seus tijolos. De palavra em palavra ergue mundos, vendavais de liberdades, por isso a sua ampla valorização e o respeito que a nação tem pelos seus escritores.
Falando nisso, não caí na rede do aprendizado da bajulação. Só ficar na sua pode ser grave. Perco muitos e muitos rompimentos de silêncio e também montanhas de elogios. Mas sigo em frente, mesmo porque não há outra direção.
Sempre fui assim, fico inventando caminhos, atalhos, o que me der na telha, e hoje o Domingo só pedia canções.

MARCIANO VASQUES

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